quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Incompreensível

 Entre tantos mundos particulares, seria muito pedir por compreensão.

A mesma frase lida por duas pessoas não tem o mesmo significado. Lida em dois dias diferentes também não. Lidas pela mesma pessoa, no mesmo dia, em locais diferentes, muda mais ainda. Cada instante é um mundo de singularidades.


Aquele cartão era para você, para aliviar a angústia de não ser compreendido. Era para fazer da ilusão uma realidade.

Sem palavras ou gestos explícitos eu entendi que você estava lá por mim, para quebrar o laço que nem havia se formado. Por instantes percebi a voracidade e amorosidade do seu coração. No tempo de um abraço de quem diz foi bom te conhecer. Que pena que a vida é breve e os momentos bons mais breves ainda.  

Queria te contar o quão nu seu espírito é. O quão fácil é para olhos treinados como os meus perceber no sorriso silencioso, entre uma gota de chuva e de lágrima, seu desejo contido.


Todo o amor do mundo é incompreensível.



Mas Fica bem. Se cuida. E vai com Deus.  
Um dia, quem sabe, nos veremos mais uma vez.



sexta-feira, 9 de setembro de 2016

E agora?

Olha moço, só posso te dizer que as certezas de ontem já não cabem mais no dia de hoje. E os sonhos de outrora perderam o brilho. Perdi as rédeas moço, agora sou só eu e esse cavalo selvagem. 

Quem me viu há um mês atrás poderia descrever em poucas palavras os meus sonhos e ambições para o futuro. Venho trilhando um caminho incerto e árduo por pelo menos oito meses, quase um parto, e dentre respostas positivas e dificuldades tenho tentado me equilibrar nessa tênue linha que liga minhas ambições à realidade.
Acontece que na última semana algo mudou. As rédeas que me prendiam ao cavalo partiram e eu caí. E agora moço, lá estava eu, frente a frente com aquele cavalo que nunca me obedeceu, que sempre correu na hora do trote, que dava pinotes quando eu precisava passar em silêncio. Lá estávamos nós, tete a tete e sem amarras.
Pois bem, decidi que aceitaria o que viesse. Moça, ninguém dá tiro no escuro. Que escuro, moço? Que tiro? Eu nem falei de violência e você já me vêm com essa conversa. Deixa pra depois, moça. Não é hora. Já não dá pra você. Olha moça, é difícil. Isso aí que você conseguiu foi a parte fácil. E essa idade, sei não, você já tá ficando velha pra isso.
E lá estávamos nós moço, eu e o cavalo, e eu olhava dentro dos olhos dele sem medo de nada. Mas moço, veja bem, o cavalo é selvagem e ele também não tinha medo de mim.
Foi quando os sonhos perderam o brilho moço. Foi alí naquela horinha mesma, quando eu descobri que independente do que escolhesse o resultado ia levar a uma coisa só. Que não adiantava eu laçar o cavalo ou agarrar ele pelo pêlo. Tudo leva a um final, que é o trabalho, moço. No final só nos resta trabalhar, independente do meio o final é um só. Talvez esse trabalho seja em locais diferentes, com coisas diferentes, com pessoas diferentes, mas só Deus sabe moço a satisfação que você vai sentir quando esse dia chegar. É que a gente não sabe de nada, viu.
Eu tava lá parada e ele olhando pra mim. Deu duas passadas pra trás. Olhei de lado como quem diz, tá indo pra onde? Mas nada aconteceu. Ficamos naquela posição como que duas estátuas. Eu guerreira sem as botas, de pé, braços jogados ao lado do corpo, entre as mãos as rédeas partidas. Do outro lado o cavalo de pêlo escuro, olhos úmidos e vivos, grande, bicho de porte, dava para ver que era forte o animal pelas ancas massudas.
Nesse momento eu reparei moço, que o bicho era tão danado de grande que podia me destruir em dois tapas. Mas não tive medo, só que também não quis brigar. Veja só moço, eu tenho medo só de uma coisa, que é de perder minhas convicções, meus sonhos, a vontade de viver sabe. Enquanto eu olhava pro cavalo eu percebi que meus sonhos não eram colocar as rédeas ou adestrar aquele bicho bravo, meus sonhos eram me tornar um ser humano, humano mesmo, daqueles que sentem e vivem, do tipo que ama e sente compaixão, sabe moço? O sonho era servir ao próximo e ajudar as pessoas a se sentirem bem e felizes. Moço, pois veja só! Não é que eu havia mesmo perdido as rédeas? Foi aí que eu descobri que todo o resto era o ego, era a vontade de ser mais. Ora, que hipocrisia a minha vestir o lobo de cordeiro.
Quando eu entendi tudo isso resolvi largar as rédeas. Que o cavalo seja livre. E os meus olhos secos se tornaram úmidos. E lá fomos nós, eu e o cavalo, como que dois amigos que depois de muito tempo distantes e brigados se encontram e se entendem. Veja só moço, sem rédeas, só eu e o cavalo selvagem.


O amor Deus proverá. 










segunda-feira, 5 de setembro de 2016

Aquilo que não é meu

Inúmeras vezes somos dominados por uma emoção que não é nossa. Aquela sensação que sobe de repente pela nossa cabeça e nos apodera como raiva, tristeza, vontade de gritar, chutar, ser arrogante, destruir, quebrar. De repente. De repentemente essa emoção chega. Não sabemos o motivo dela iniciar, ela simplesmente se apodera de nós.

Choro e quando me perguntam o motivo eu não sei explicar. Quero bater portas e janelas, quebrar os vidros, mas não sei a razão. Lembro de quando era criança e passava por essas situações sem explicação. Praticamente todas as vezes eu inventava um motivo para as emoções inexplicáveis, visto que ninguém aceita choro sem motivo nem raiva sem razão.

Foi então que descobri que essa emoção não era minha. Nunca foi. Nunca será. Ela chega de outros que estão ao meu redor, ela vêm no tom de voz, na narração do dia estressante, cheio de gritos e raiva.

Essa emoção não é minha. 

Junto com a raiva e a tristeza vêm um aperto no coração, enjoo, uma pressão na cabeça ou na nuca. Essa emoção não é minha, repito mais uma vez para poder afirmar ao meu coração que se acalme, não se identifique e que isso vai passar. Assim como veio, irá embora.

Muitas vezes por estarmos perdidos em nossos pensamentos não nos damos conta do que ocorre ao nosso redor, muito menos da origem das nossas emoções. Várias vezes estamos tranquilos, mas ao nos aproximarmos de uma pessoa ansiosa ou nervosa acabamos sentindo as mesmas coisas e partilhamos inconscientemente suas emoções, as levamos para casa e reproduzimos em amigos e familiares.
Contudo, quando começamos a observar a nós mesmos, nossos pensamentos, emoções, ações, palavras... Fica ligeiramente mais fácil detectar quando uma emoção externa começa a nos apoderar. Ela chega como uma pedra jogada em águas tranquilas. Quando estamos observando podemos detectar a pedra chegando, o movimento que provoca na água e como que por instinto nos afastamos do atirador de pedras. Mas se estivermos imersos em nossos pensamentos e devaneios, a pedra atirada, por menor que seja vira um monstro. Reagimos durante horas a esse evento que como por encanto iniciou.

Sabe Deus de nossas limitações e sabemos nós o que mora em nosso interior.

Essa emoção não é minha. Nem nunca será.





quarta-feira, 24 de agosto de 2016

Véu dos meus olhos




É fácil ser bom entre os bons.

É fácil ser gentil entre os gentis.

Honra o seu caráter quando for bom entre os lazarentos de coração.

Se alegra do seu progresso quando for gentil com os arrogantes.

Porque qualquer um pode ser bom entre os bons, mas só os verdadeiros conseguem passar pela prova.


Lembra: É fácil ser bom entre os bons.


Like the wind

Naquele dia eu cheguei super cedo, acho que com uma hora de antecedência, pensei em estacionar o carro e caminhar próximo à praia, mas aquele sol de meio dia me fez mudar de ideia. Andei até a praça ali perto e sentei em um dos bancos. Do outro lado, no meio da praça estavam uma senhora, uma jovem, um senhor e um menino  nuelinho de aparentemente dois anos de idade.
Qualquer um veria que eram moradores de rua e que estavam ali almoçando. O menino era filho da moça de short jeans e blusa de alça. Danado que era não parava em um canto, moreno, com as perninhas definidas como todo criança tem, tinha no lado direito do rosto um arranhão vermelho vivo que devia ter sido de alguma queda recente.
Flavinhooo! Flavinho, desce daí. Sua mãe chamava enquanto ele ria e corria ao redor da praça brincando sozinho. Corria atrás do pombo, caia, levantava, subia nos bancos e chamava atenção de todos que passavam pela beleza da sua nudez de criança, nudez de corpo e de alma.
Não lembro quem sorriu primeiro, só sei que ele veio brincar perto do banco em que eu estava sentada. Subia no banco, pulava no chão, sentava do meu lado e olhava atento pra o papel que eu segurava como se também quisesse saber que negócio interessante (ou não) era aquele que me prendia a atenção. De repente Flavinho pegou uma folha do chão e falou "Óo!" e eu respondi "Hmm, a folha é da árvore" com aquele tom de quem acabou de falar algo super importante. Mas ele continuava "Ó, ó!", parou embaixo da árvore, olhou para cima e suspendeu a mão que segurava a folha como se quisesse de alguma forma prender novamente aquela folha amarelada na árvore.
Nesse instante eu sabia que havia algo ali para eu aprender, e que aquela criança me mostrava alguma coisa que até então eu não tinha entendido. Flavinho veio até mim e me deu a folha, na verdade ele jogou a folha na minha direção. Eu peguei do chão e segurei para entregá-lo, mas ele olhou para mim, apontou para o topo da árvore e fez "Ó". Eu já tinha entendido que ele queria prender a folha na árvore novamente. Tentei falar alguma coisa sobre não ser possível, mas que não me recordo bem agora. Depois disso ele brincou, caiu, jogou folha e pedra para cima e eu tive que ir embora devido ao horário.

Mas o que aquele menino nuelo queria me mostrar?

Dentre as várias interpretações daquele dia eu entendi que tudo passa, tudo tem seu tempo e que por mais que façamos um esforço para retornar ao que já se viveu não há como fazer isso acontecer. Assim como a folha que cai da árvore não pode ser presa novamente ao galho, nós não podemos nos prender a locais, pessoas ou momentos que passaram pela nossa vida.
A árvore era uma amendoeira daquelas que tem a folha grande e vistosa. O topo da árvore estava cheio de folhas de cores variadas, várias verdes, muitas alaranjadas, outras quase vermelhas. Apesar de ser final de inverno aquela árvore parecia ainda estar no outono. Cada folha em um momento diferente de desenvolvimento compartilhando da vida em comum presas aos galhos da árvore. Mas aquela na mão de Flavinho já havia caído, seu tempo no galho tinha terminado e ela agora voava errante com o vento.
De certa forma nossa vida também é assim. Podemos ser como uma folha na vida de alguém. Brotamos, participamos da vida daquela pessoa e depois com o tempo viramos a folha caída que não encontra mais espaço entre os galhos. Ou mesmo quem sabe a árvore ali mostrasse a energia que nos move e cada folha nosso momento de desenvolvimento e crescimento na vida.

Mas não se devolve ao galho uma folha caída... ou devolve?
Não sei... Só sei que tudo passa... tudo passará.
Cabe a nós viver o hoje.

terça-feira, 24 de maio de 2016

Tarô (copiei e colei aqui para me lembrar depois)

 
Orientação

Olhando bem para a ilustração, você já fica com uma primeira idéia do que esta lâmina quer transmitir: um anjo multicolorido voa pelo espaço ilimitado levando consigo a figura de uma mulher: não encontro expressão mais linda para definir o nosso mestre interior do que esta representação.

Mas, se notar bem vai ver que a figura feminina está com o rosto virado para esta figura angelical. O que isso quer dizer? Quer significar que muitas vezes damos às costas ao nosso bem mais precioso: nossa proteção, nosso guia interno, nosso mestre, nossa intuição: aquela voz que vem do coração e que fala primeiro que nosso cérebro.

E por que fazemos isso? Porque fomos viciados em acreditar apenas naquilo que vemos com nossos olhos, ou apalpamos com nossas mãos ou pés. Os estímulos do mundo externo são, para nós, muito mais reais do que a nossa sabedoria interna. Por isso nos tornamos discípulos de alguém, fanáticos de uma religião ou caminho, apegados a pessoas que nos rodeiam, achando que são eles os nossos guias. Vã esperança! O nosso guia não está fora de nós. Está dentro de cada ser.

Literalmente é isso que a carta diz. Acompanhe: “A verdade do seu próprio ser mais profundo está tentando mostrar-lhe o caminho a seguir neste exato momento e, quando esta carta aparece, significa que você pode confiar na orientação interior que lhe está sendo dada. Esta orientação vem por meio de sussurros, e algumas vezes podemos hesitar, sem saber se compreendemos corretamente. As indicações, porém, são claras: seguindo seu guia interior você se sentirá mais pleno, mais integrado, como se estivesse se movimentando a partir do centro do seu próprio ser. Se você a acompanhar, essa célula de luz o conduzirá exatamente onde você precisa ir”.

No entanto, nem sempre é fácil ouvir esta voz interior. Para isso é preciso calma, sossego, paz. Se você sente que um exercício com imagens mentais poderá ajudá-lo a encontrar seu guia interno, tente este. Faça por 7 dias sempre ao acordar e, se sentir que resultou, repita por mais 14 dias, completando um ciclo de 21 dias. Ou continue fazendo sempre que sentir necessário. Se estiver fazendo outro exercício não misture. Espere que o outro acabe para começar este.

Exercício para encontrar seu mestre interior. 

Sentado, olhos fechados, pés firmes no chão, mãos apoiadas nas pernas com as palmas viradas para dentro, respire calmamente três vezes e leve sua atenção para a sua intenção (que está no título do exercício) e veja, sinta, ouça, perceba ou imagine que entra dentro do seu coração pelo orifício do seu corpo que achar melhor. Examine bem o ambiente do seu coração. Se estiver apertado alargue o espaço. Se estiver escuro ilumine com luz cor de rosa. Se as paredes forem opacas substitua por cristais translúcidos. Caminhe então para o centro do seu coração chamando pelo seu mestre. Conte lentamente e mentalmente até 6 e veja ou imagine que vê uma porta que se abre e por ela entra o seu mestre . Vá ao encontro dele. Abrace-o e seja abraçado por ele. Ouça o conselho que ele tem para lhe dar. Então marque um encontro com ele para revê-lo todos os dias. E sentindo que encontrou seu mestre, despeça-se dele, saia do seu coração pelo mesmo caminho que usou para entrar dentro dele e sentindo-se pleno, leve, alegre e firmemente sentado na cadeira, respire e abra os olhos.

Qual foi o conselho que ele lhe deu? Escreva o conselho num caderno que reservou só para isso.

segunda-feira, 23 de maio de 2016

Fatos reais de uma vida de ilusões

A primeira vez que te vi nem reparei que você existia. Me ofereceu uma cadeira para sentar, pouca diferença me fez, lembro apenas de ter visto do seu pescoço para baixo, alto, largo, de jaleco e com andar meio desajeitado. Da segunda vez que eu te vi você estava sentado debruçado em sua mesa trabalhando, foi quando soube que trabalharia com você. Dessa vez eu vi seu rosto, nada me atraiu, seu sotaque puxado menos ainda. Lembro que você me deu algo ridículo e despretensioso para fazer, mesmo assim eu fiz como se fosse a coisa mais importante que eu já havia feito. Da mesma forma eu procurei o que fazer porque você aparentava não ter ideia das atividades que poderia passar para mim.
Um dia você me mostrou a área dos animais e se comportou como tal, tal como uma raposa que sutilmente se aproxima da preza. Me perguntou como era ter um relacionamento no meu país, te expliquei qualquer coisa sobre as contradições que ocorrem e o meu ponto de vista. Você queria saber se eu achava certo ou errado e eu tentei te dizer que não acredito em dicotomia. Naquele dia quando saímos dali minha intuição falou que aquela pergunta era você sondando a minha vida com segundas intenções, mas não quis acreditar nessa verdade e simulei para mim mesma que era apenas uma curiosidade.
Por duas semanas eu trabalhava com você apenas durante os finais de semana, mas quando a rotina se normalizou eu te via de domingo a domingo, das nove da manhã às cinco da tarde, e muitas vezes comecei a te ver depois das cinco. Nunca te contei, mas eu te achava parecido com uma máquina fazendo coisas automaticamente, sem demonstrar o que se passava dentro de você. Durante esse meio tempo eu tive problemas, inúmeros problemas que eu não tinha como solucionar, fugiam do meu alcance em proporção e distância, pois ocorriam em outro país. Eu não sei se eu era transparente para você, mas toda vez que eu estava triste você sabia, se com dor você identificava, se cansada você também me dizia. Sei que uma de suas qualidades é ser um bom observador, mas você me lia por inteiro e sabia como me acalmar. Passou a ir caminhar comigo, me disse que não conhecia a cidade e eu como descobridora de mares me ofereci para te mostrar.
Em poucos dias fomos fazer uma trilha, que para mim era apenas uma longa caminhada. Você levou sua câmera, se deitava pelo chão tirando fotos, não é de se estranhar já que com seus quase dois metros de altura se abaixar não seria suficiente. Tentou me ensinar a usar sua câmera, aperta assim, segura assim, quando eu vi estava por trás de mim e eu entre seus braços querendo achar que aquilo não era mais que a sua amizade. Tirei sua foto umas trinta vezes até uma ficar boa. Nunca entendi como eu saia bem nas fotos que você tirava, mas você sempre desaparecia nas que eu fotografava. Fazer o quê né, a câmera era sua há anos, eu não ia aprender em segundos o que você levou anos praticando.
Nesse mesmo dia quando caminhávamos para casa paramos em um restaurante para lanchar. Lembro como se tivesse sido ontem a minha cara de medo e susto quando se declarou para mim. Não quero te enganar saindo como se fosse seu amigo, eu quero ter um relacionamento com você, gosto de você. Suspirei, não conseguia mais comer. Tudo que suspeitei era verdade menos a sua intenção de sermos apenas amigos. Te disse que não sabia o que fazer com essa situação, trabalhávamos juntos, convivíamos juntos, não poderia passar disso. Comemos. Conversamos e eu sem saber como sair dessa resolvi apelar pelo tempo. O caminho inteiro para casa você continuou a se declarar para mim afirmando que sabia que daríamos certo juntos.
O cemitério na minha vida possui um local especial. Meu primeiro beijo tinha vista pro cemitério. Quando você explicou o motivo da sua declaração estávamos parados em frente ao cemitério que fica no meio da cidade. Me falou do seu trágico primeiro amor, amor que nasceu do silêncio e morreu antes mesmo de brotar na terra. E como eu era parecida com seu primeiro amor, e como isso era pra você a chance que havia recebido de fazer o que você não fez da primeira vez. Se declarar, tirar o amor das sombras e fazê-lo brotar. Fazia frio, mas por ser verão eu não havia levado meu casaco, você me deu o seu e eu com muita relutância aceitei, aceitei também a sua declaração.
Quando cheguei em casa me arrependi de tudo, achei que havia errado desde o princípio e te mandei uma mensagem de que não poderia ficar assim, que eu não deveria ter aceitado e que voltava atrás. A partir daí não tinha mais um dia de paz, sua segunda qualidade que impressionou foi a persistência e dedicação, mesmo ouvindo não diversas vezes ao dia, diversos dias na semana, você não desistia. Fizemos um acordo de que eu aceitaria sair com você como amigos e se um dia despertasse algum sentimento por você conversaríamos novamente. Você me fez aceitar que eu te encontraria todos os dias após o expediente e que caminharíamos juntos como uma forma de nos aproximarmos. Te devolvi o casaco, mas aceitei caminhar com você.
Muito tempo depois você me disse que tomou coragem para se declarar por mim porque eu era legal e gentil com você. Nunca pensei que isso seria motivo para alguém se declarar, eu sou legal com todo mundo, imagina se o critério fosse apenas esse. Mas para você foi a chama que acendeu sua persistência.
Tinha dias que eu não aguentava mais, eu ia ligar para polícia e te denunciar, quis chamar sua chefe e dizer tudo, mas não fiz. Você se mostrava responsável com seu trabalho, falava com sua família todos os dias, trabalha para eles, vivia para eles, sustentava seus sonhos e os de sua família sozinho. Se orgulhava em ver sua família vivendo bem mesmo quando você tinha que se privar de ambições e anseios para isso. Eu não queria destruir tudo. Não era justo, eu não achava justo.
Você me dizia que nunca teve uma namorada e a única namorada que teve foi imaginária, era uma amiga a quem nunca se declarou, com quem sonhou casar e ter filhos, mas que se foi antes de terem tempo mesmo que para dizer eu te amo. Vi você chorar por um amor que nunca se materializou, vi você usar um boné mesmo na chuva por ter sido da sua sobrinha que você não via há meses, vi você me amparar quando eu precisei. E não precisei ver mais do que isso para entender que mesmo não me sentindo atraída eu gostava de você.
Lembro do nojo que senti da primeira vez que pediu para segurar a minha mão. Você não acariciou, não fez nada mais que segurar a minha mão. Eu sentia os calos na sua palma, a pele grossa e áspera me fazia não querer segurar sua mão por mais tempo. Pedi que soltasse, que parasse de usar as caminhadas para se declarar de novo e de novo, mas que fosse um momento para falar mais de cada um, dos gostos, da vida. Você disse que eu iria me arrepender, que sabia que eu gostava de dormir com a cabeça apoiada em seu ombro, falou mais umas duas coisas que eu gostava e que não lembro agora, então me disse que para você nós já tínhamos vivido juntos em outra vida, outro momento.
Passamos a ir no mercado juntos, você carregava meus milhões de sacos mais os seus até em casa, eu não queria deixar, mas você insistia e levava quase tudo sozinho em uma caminhada de mais de meia hora. Brincava comigo se fazendo de besta e me fazia rir mesmo a contragosto, olhava para mim e se deixava bater contra a parede, passava o cartão do ônibus para abrir a porta e falava besteiras em uma língua inventada por você que me davam raiva, mas que ao mesmo tempo eu achava graça. Quando passávamos por algum casal de mãos dadas você fazia o favor de me mostrar e dizer que devíamos andar do mesmo jeito. Cheguei a chorar na sua frente de aflição pela persistência descomunal em um relacionamento que eu não via como iria começar ou terminar sendo você de um mundo e eu de outro.
Até que um dia você me convenceu. Fomos caminhar em um dos locais que eu mais gosto, ao lado de um rio descendo a colina que vez ou outra faz cascata de cachoeira. Tem uma escadinha que dá em frente a ponte que liga as duas margens do rio, fica em cima da parte que parece cachoeira, do lado direito um banco de praça em baixo de uma árvore. Sentamos no banco para olhar o rio. Já havíamos sentado ali inúmeras vezes, almoçado ali, lanchado ali, mas dessa vez apenas sentamos. Você virou para mim e disse que tínhamos feito até então tudo que um casal faz ou mais que isso, pois nos víamos todos os dias por mais de doze horas em um dia de vinte e quatro horas, saíamos todos os dias, nos dávamos bem juntos, trabalhávamos bem juntos, só não nos beijávamos. E foi aí que você me desarmou e nos beijamos para depois nos acabarmos na risada, pois você apesar de ter insistido tanto não sabia o que fazer. Seu primeiro beijo era meu.  
Dali em diante você parou de ser persistente pois sabia que já havia me ganhado. A rotina era a mesma, mas em sua loucura você não sabia o perigo que era se descobrissem que estávamos juntos. Decidimos então que o relacionamento seria só nosso, sem divulgação nem conhecimento de ninguém. Nos separamos por duas semanas e como se fosse brincadeira do destino você me ligava quando eu pensava em você, e eu te mandava mensagem na exata hora em que você abria o celular.
 Você sempre sério me fez acreditar que por mim faria do meu mundo o seu mundo. Que ficaríamos juntos e que os seus filhos seriam os meus filhos. Descobri que eu gostava de segurar sua mão, de deixar a minha cabeça repousar sobre o seu ombro e de conviver com você apesar de sua displicência e de nada ser perfeito, pois nada é perfeito, mas fazíamos boa convivência em todos os sentidos.
Descobri que era verdade quando você me dizia que daríamos certo, que eu iria me arrepender por não termos ficado juntos logo. Não me arrependi de fato, mas desejei ter tido mais tempo com você. Viramos um casal que convivia vinte e quatro horas juntos sem aparentemente ninguém saber. Apesar de me dizer que nunca havia abraçado uma mulher em um relacionamento você sempre soube o que fazer, nunca me machucou nem mesmo me deixou sem sentir desejada. Pelo contrário, você sabia a pressão certa de me segurar, eu cabia exatamente em seus braços e você em minha calça, seus pés em meu sapato. Mesmo sendo uma pessoa gigante suas mãos eram do tamanho das minhas e suas roupas também cabiam em mim. Nunca entendi que proporção era essa, mas tudo bem.
Discutíamos a fome, a pobreza, a soberba, e a marca do papel higiênico que iriamos comprar. Você veio para minha casa porque sabia que eu nunca iria aceitar casar com alguém que eu meramente conhecia. Você veio e abriu espaço em meu coração para entender que eu tenho sim capacidade de viver com alguém, e viver bem. Quebrou meus traumas e me fez ver que no fundo talvez não seja tão ruim assim ser um casal.
Eu brigava com você, mas você nunca brigou comigo, nem nunca me deixou chorar. Era tão chato com isso que nem quando eu queria eu chorava só por causa da sua chatice. Fiquei triste e você passou a ser mais organizado com suas coisas, bebia menos, fumava menos. Você era todo errado, mas mesmo assim eu gostava, e gostava mais ainda por você admitir que não era perfeito. Você nunca foi bom pra fazer escolhas, gosta do belo, do que desperta o seu coração. Também nunca me explicou ao certo porque decidiu loucamente que precisava ficar comigo mesmo sabendo do risco que corria se eu denunciasse todas as mensagens que tinham sido enviadas por você.
Eu vivi com você um misto entre amor e admiração. Não vou contar mais porque levaria muitos dias para explicar tudo o que nos levou a chegar até aqui.

O amor é mais forte que a distância, era isso que você dizia e são essas as palavras que eu me forço lembrar quando você some entre seus problemas e faz como se esquecesse de mim.
Todos os dias eu acordo pensando em desistir de você, no presente você não passa de uma lembrança boa e saudosa do dia em que eu pensei ter encontrado o meu amor personificado. Você, a quem eu tanto refutei, a quem eu mostrei minha fragilidade e fortaleza, você... essa pessoa que eu tenho que decidir todos os dias se ainda está comigo ou não. Você que fez tanto e que hoje não faz mais que desaparecer. Você por quem eu já chorei e roguei a Deus para que me fizesse esquecer.

Você...



A minha intuição diz para eu ter paciência, mas só Deus sabe até onde isso vai chegar.




“Se está escrito antes dos tempos...”   
  




sábado, 21 de maio de 2016

Coisas que eu gosto

1. Casa cheia, mas não cheia só pra festa, casa cheia de gente que vive junto, come junto, briga e aprende a conviver juntos.

2. Amigos na sala de estar.

3. Dançar e dançar e dançar.

4. Cozinhar com verduras frescas.

5. Ir na feira comprar as verduras e flores.

6. Observar os peixes nadando no aquário.

7. Observar o mar.

8. Subir uma montanha.

9. Andar na natureza.

10. Assistir filme no cinema.

11. Ter comida pronta e quentinha na hora que estou com fome.

12. Caminhar, andar de bicicleta, patinar.

13. Ler.

14. Ouvir música.

15. Ir ao teatro e ao museu.

16. Aprender algo novo.

17. Superar obstáculos.

18. Conversar.

19. Reconhecer minhas limitações.

20. Descobrir novas possibilidades.

21. Me desapegar do que não me acrescenta.

22. Conhecer pessoas e novos lugares.

23. Desafiar o raciocínio lógico.

24. Céu.

25. Identificar na minha vida a ação de anjos e seres espirituais.

26. Encontrar alguém que não vejo há muito tempo.

27. Meditar.

28. Aprender.

29. Criar.

30. Ter tempo pra mim mesma.

31. Quando consigo ser gentil com as pessoas.

32. Quando tenho paciência comigo e com os outros.

33. Quando consigo conviver com meus familiares.

34. Quando escuto e sou escutada.

35. Quando as decisões tomadas são feitas em conjunto.

36. Sorvete.

37. Hortelã e gengibre.

38. Encontrar as pessoas que amo.

39. Amar as pessoas que encontro.

domingo, 8 de maio de 2016

Flores e afins


Desde ontem o meu coração chora silencioso, a garganta trava com o soluço que não sai e os olhos ardem com as lágrimas que não chegam.

Engraçado como eu sempre chego a esse ponto de amar demais, de amar todo mundo, e de não me sentir amada. Desde anos eu sofro desse mal e é sempre assim, até chegar o dia que alguma palavra é dita ou não, e pelo excesso de palavras que me deixam no vazio ou pelo excesso de vazio que vem da ausência de palavras eu faço a escolha mais difícil e deixo esse tal de amor bandido ir embora pra cuidar de quem mais precisa do meu amor e bem querer, eu mesma. Se machuca? Sim, sempre, mas hoje aconteceu algo que eu não esperava e que me ensinou alguma coisa importante...



Fui na feira comprar umas folhas e flores. Passei pela barraca do freguês, mas hoje eu quis comprar na que fica do lado oposto, vi umas rosas mais abertas e achei que seria melhor comprar lá. O vendedor que já me conhece fez cada rosa por dois reais e cinquenta o que é um preço bem barato em dia de feriado, e me disse pra escolher as que eu queria. Escolhi uma branca, uma rosa clarinho, e outra vermelha, a rosa vermelha tinha espinhos e o espinho furou minha mão de leve, mas dei um Ai de dor e surpresa. Ele que estava ao meu lado me mostrou a sua mão inchada e toda machucada, disse que furava a mão toda hora, e eu perguntei se a mão já não estava "calejada", expressão típica para quando já nos acostumamos com uma situação e paramos de sentir a dor que ela nos provoca. Ele me respondeu que não, que toda vez doia da mesma forma, tirava até pele, o que acontece é que acostuma mesmo quando doi, você sente a dor.
Saí dalí sem saber se eu tinha entedido direito. Meio difícil isso de entender.

Fui em outra barraca porque ainda me faltava comprar umas coisas. O rapaz que me atendeu depois de começar a embalar o que comprei me perguntou se eu era paixonada, você é apaixonada menina?, pensei bem brevemente e respondi com vontade, sou apaixonada sim, e ele me disse, pois seja apaixonada pela vida, porque o resto não vale muito a pena.

Cheguei em casa, lembrei que havia esquecido algo com o feirante, nem sei se ele cobrou, mas volto lá depois pra buscar. Fui arrumar as flores no jarro, umas margaridas pequeninas e uma galha de folhas que o freguês colocou pra mim. Depois de colocar o jarro na mesa, vi que uma folha caiu em minha cama, pequenininha e verde brilhante em formato de coração. Não tem outra, tanto amor que seria injusto eu ficar triste por uma dor que passa.
....



Fatos reais de uma vida de ilusões.




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Tem gente que não acredita em Deus, eu não tenho condições de não acreditar. Ele vive a cuidar de mim, a me alegrar quando estou triste e a me explicar sobre a vida mesmo quando estou sofrendo pela centésima vigésima terceira desilusão. Ele aparece em diversas formas e me ajuda sem medo de me fazer perceber que é a sua força agindo em minha vida.

A dor que sinto vai passar, mas a lembrança de Deus em minha vida ficará comigo para sempre...  

sábado, 16 de abril de 2016

Sonho da meia-noite


A câmera percorria o local com poças de água suja e casas maltrapilhas. E o narrador dizia, Você sabe como se chama aquele que entra e destrói o seu território? Se chama invasor. Mas não há mais como recuperar o território expulsando eles, eles se multiplicaram e agora são muitos para conseguirem outro lugar para morar. É preciso aceita-los, perdoa-los e trabalharmos juntos. Durante essa cena eu via que uma mão soltava um pequeno porco-espinho ou animal parecido com esse e ele como que retornando a um velho local conhecido do qual havia sido retirado ia caminhando e cheirando aquela água que agora parecia suja. A câmera foi para dentro de uma sala e mostrava de um a um as pessoas sentadas no chão entre ex-invasores e nativos juntos e decididos a discutir as melhorias para aquele lugar.     
Na última cena eu a vi novamente. Seu cabelo negro chamou minha atenção, liso e curto desfiado nas pontas, mais ou menos na altura da orelha, sentada na cadeira de líder atrás de uma mesa. Antes de eu poder vê-la os meus olhos percorreram uma sequência de bandeiras dispostas uma sobre a outra em um suporte e por fim a última bandeira que era escolhida para representar o local, North Carolina, eu ouvia. E ao lado ela abria um sorriso enorme no rosto. O narrador dizia então, Havia chegado a hora de mais um momento de amadurecimento na sua vida e isso envolvia a tomada de cargos de liderança.
Ela é jovem, olhos sorridentes e recebeu a responsabilidade de responder pelo seu povo, índios nativos da américa.

Antes disso tudo ocorrer lembro de outra cena. No início desse sonho acho que cheguei a ver como ela estava antes, seu medo e insegurança, sua união com alguém e que em determinado momento o amadurecimento e a responsabilidade chegariam, mas não consigo lembrar ao certo como a cena foi mostrada.
A bandeira no final eu lembro que havia sido redesenhada, com diferentes tons de verde e azul dispostos parecendo um arco-íris dentro de um círculo. Haviam mais símbolos, mas não lembro agora. 

Um sonho... e isso tudo foi apenas um sonho...

sexta-feira, 15 de abril de 2016

Sendo luz


Tem sido difícil me concentrar, esvaziar os pensamentos, desligar do mundo e conectar com o meu vazio interno, vazio que me guia na minha busca espiritual e pessoal.
Até mesmo para escrever meus parágrafos desordenados tem sido difícil, porque a minha mente voa longe e tão rápido que não tenho tempo de resgatar o que eu gostaria de escrever.
O ambiente externo apesar de não ser um fator determinante para a minha capacidade de concentração e desenvolvimento de sentimentos exerce uma grande influência. Pude confirmar isso após ter passado um ano e meio vivendo em um local que tinha por hábito ser extremamente silencioso, reduzir as atividades ao final do dia e cultivar árvores ao longo das ruas. Após alguns meses lá ouvindo as mesmas músicas de meditação que escuto aqui eu pude viver dias em que acordava sentindo um amor incontrolável sem explicação, dias em que a alegria se espalhava pelo meu corpo como uma onda sem fim. Tive momentos difíceis e de tristeza, mas a tranquilidade do ambiente me ajudava a estabelecer um grão de tranquilidade interna.
Agora eu passo por um momento de transição, no qual preciso entender que a minha tranquilidade interna impacta e repercute no ambiente externo. Que se eu conseguir cultivar diariamente os pensamentos de amor e luz, a energia ao meu redor também refletirá isso. Não é fácil ser o oposto do meio em que vivo. Não é simples nadar contra a maré. Acordar e perceber como algumas músicas tem estruturas de mantas e como as pessoas conseguem incessantemente ouvi-las, são curtas e repetitivas, falam a mesma sentença por mais de dez minutos, mas a única diferença é que é sobre sexo, violência e mazelas. Sinto um frio na espinha quando escuto aquele toque no celular que é o sino dos templos de meditação alertando a nova mensagem que chegou. Tlim, Tlim, Tlim, e lá vamos nós entrando em um transe de ambições materiais. Não é fácil, mas isso não quer dizer nada. Quanto mais nado contra a maré mais forte ficam meus braços, mais experiência ganho, melhor é o resultado.

Cada dia que passa reconheço que os pensamentos se materializam mais rápido do que imaginamos que aconteça. Cultiva os pensamentos que você quer ver em sua vida, cultiva e colherá.      

domingo, 6 de março de 2016

Será que você me conhece?


Como você me conhece?

Me pediu para não pensar pela décima ou trigésima vez.

Que raiva que me deu. Saber que você me conhece e bloqueia meus pontos fracos.

Eu penso demais. Em segundos eu vivo uma vida inteira em pensamentos. Faço da alegria um drama, pequenos atos transformo em um filme inteiro.

Mas você, que só Deus sabe como me conhece, pediu para eu não pensar.

Eu queria criar um mundo em minha mente e brincar com os fantoches de pensamento, mas você não deixou.

Cortou a minha diversão e me prendeu nessa realidade sem drama ou magia.

Alguns poderiam dizer que mesmo com o seu pedido meu pensamento é livre para divagar, sim ele é, mas mesmo a divagação muda de rumo.

A vida caminha com você ou não... meus pensamentos divagam com você ou não... 
Eu só queria romance, mas romance sem ilusão não existe. Sem ilusão nem o que chamamos de realidade existe.




domingo, 21 de fevereiro de 2016

O que é o amor?


Ontem por acaso assisti a um vídeo muito interessante, era um diálogo entre J. Krishnamurti e algumas crianças de uma escola. Fiquei tão encantada com o vídeo que hoje assim que tive tempo fui pesquisar mais para ver o que encontrava. Dentre vários da lista escolhi ver um chamado Descobrindo o amor... ou algo assim. Eu sempre me perguntei várias coisas, o sentido da vida, a melhor maneira de viver a vida, como ter pensamentos positivos, como ajudar os outros, como ser feliz e até mesmo como amar.
Assistindo ao vídeo ele traçou uma investigação, uma observação detalhada desde significado de palavras a sentimentos que possuímos no nosso dia a dia. Podemos chamar o apego de amor? Seria a possessividade amor? Ciúmes é amor? É o carinho entre mãe e filho?
Questões vieram à tona sem parar, uma atrás da outra com observações e exemplos. O apego nos remente a responsabilidade e a afeição, mas traz consigo o medo da perda e do sofrimento. Amor e medo não andam juntos, portanto, o apeno não pode ser amor. A possessividade e o ciúmes também não são amor. A relação mãe e filho não necessariamente é amor. Mas o que é amor afinal?
Constantemente ele falava Ouça cuidadosamente, Observe a si mesmo, Investigue a si mesmo, Faça isso agora enquanto estamos falando, Devagar, Pensem, Não falem palavras em vão e vazias. Deveria eu então iniciar a minha busca enquanto assistia o vídeo, mas foi aí que recebi uma mensagem no celular. Explicarei em instantes o motivo dessa mensagem ter me desestabilizado.
Se não foi ontem ou antes de ontem, um amigo não muito próximo veio conversar comigo sobre seu relacionamento amoroso. Me contou sua história, decepção, e em sua conclusão ele estava morrendo de amores, apaixonado e faria qualquer coisa para ter a sua amada de volta. Dei um único conselho. Escolha no calendário uma data e até esse dia tente todos os dias algo diferente, um pequeno gesto, para que ela se sinta amada por você, cuidada e desejada. Faça o seu melhor, mas se até o dia escolhido ela não responder positivamente e não demonstrar nenhum interesse em estabelecer o relacionamento você deve deixar isso passar e passar a prestar mais atenção em sua própria vida. No fim da conversa ele estava satisfeito com a ideia e disposto a fazer de tudo. Menos de 48h se passaram e ele me enviou a mensagem e ela dizia que ele havia descoberto nessas poucas horas que não a amava realmente e mais algumas frases vindas de seu ego decepcionado por ter sido rejeitado.
Isso foi o suficiente para me abalar. Quase chorei. Não sabia o que era amor, vinha assistindo a uma palestra que mostrava tudo aquilo que Não era amor e em meio a isso vejo uma demonstração real de tudo isso.
Muito do que pensamos ser amor não passa de nossa ambição de possuir, desejo de conforto, prazer, satisfação, suprimento de nossas carências internas. Quando paramos para observar é disso que cercamos nossa vida. Por que ele se desesperou? Pelo amor ou pelo desejo perdido?
Mas então o que seria o amor...
O vídeo é conturbado com uma audiência cheia de pensamentos vagos e perguntas fora de contexto, passa mais de uma hora e não tive a resposta, ficou a meu cargo descobrir.
Tem um caco de flores no meu quarto e parei para observar. O amor deve ser fruto da observação, eu observo a flor, vejo seu formato, suas cores, limitações e beleza. Eu apenas observo, não tiro do caco, não corto suas pétalas. Respeito, observo, deixo que leve sua vida e sigo com a minha.




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Estávamos andando na rua quando o segurei pelo braço, ele virou e paramos virados um para o outro. Olhe nos meus olhos, eu disse. Olho dentro dos meus olhos e ouça o que te direi agora. A arte é um retrato da sociedade. Como que você pode pedir uma música com qualidade? A música trata da vida cotidiana das pessoas. A música fala do dia a dia das pessoas, fala dos seus desejos, das suas angustias, dos seus medos e ambições. Se a música é vazia é porque a vida das pessoas também é vazia. Toca na mesa do bar no fim do expediente que é pra fazer o quadradinho, reboladinha, esfrega e rola. Se isso satisfaz os ouvintes é porquê muito na vida dessas pessoas se limita a isso.   

sábado, 23 de janeiro de 2016

Um texto amargo e talvez injusto sobre a cidade planejada para ser o paraíso


Hoje eu entendi que o dia era para escrever. Todos os planos cancelados, a internet cortada na biblioteca e em casa, presa comigo mesma entre carros e um tanque de gasolina que diminui rapidamente. Não foi essa semana que coloquei quase cinquenta reais? O dinheiro vai escoando pelos dedos e a gente nem se dá conta.




O céu visto pela minha janela parece estar mais distante do que antigamente apesar das nuvens densas que ao decorrer do dia fazem um chuvisco. Tão engraçado como as nuvens parecem estar mais altas, e mesmo nublado a cidade ainda brilha com os resquícios de luz solar. Moro na cidade que têm tudo para ser o paraíso. Belezas naturais em cada esquina, um centro histórico com prédios construídos há mais de quinhentos anos, uma população que sabe e gosta de festejar, pessoas que se dedicam no dia a dia para receber o seu salário e viver uma vida digna.
Me lembro ainda de quando minha vó tinha saúde e me contava que passava um rio pela nossa rua, lembro das aulas de história em que o professor dizia sobre o rio que cruzava o centro histórico, de quando minha mãe falava que o ônibus não passava naquele bairro onde o rio aos poucos desapareceu. Eu ainda cheguei a ver muitos dos poucos rios que haviam sobrevivido até os anos 90, mas todos eles já tinham virado coletores de esgoto a céu aberto. Que criança saberá que ali onde hoje fica o parquinho antigamente era o rio esgoto? Todos os rios foram mortos à medida que a cidade crescia e depois lacrados em tubos de cimento para dar passagem aos carros. Minha cidade que têm tudo para ser o paraíso na Terra perdendo seus brincos de ouro, sua Veneza tropical.
Entre um prédio e outro um pouco de mato e um coqueiro que nem é nossa árvore típica. Mas como que duas bandeiras triunfantes dois coqueiros estendem suas palhas solitárias em um plano de fundo distante. Até lá só a selva de pedra. Engraçado como eu consigo imaginar a cachoeira que descia pela ladeira e o vale onde hoje se encontra a rua comercial. Entre o vai e vêm de pessoas eu me pergunto se será que é isso mesmo que eu vim fazer aqui: destruir mais, comprar o que não preciso, gastar o que não tenho.
São tantas coisas acontecendo ao mesmo tempo, mas a população é o que toda boa cidade tem de melhor. Na minha cidade que poderia ser o paraíso, a população é extremamente religiosa e supersticiosa, varia entre gente que se veste de branco toda sexta ao pregador com a sua bíblia no ponto de ônibus. A religião é diversificada, mas mesmo proclamando que Deus é amoroso e perdoou a todos, seus fiéis mais próximos ainda não conseguiram entender a diferença entre opinião pessoal, respeito e compreensão do que hoje chamamos intolerância religiosa. Esse dilema entre valores ainda complica a convivência na comunidade, mas mesmo assim vamos vivendo entre pedradas e cultos dominicais. Como dizem “aquele que nunca pecou que atire a primeira pedra”, fico a pensar quantos santos e não pecadores existem por aí para termos tantas pedras sendo atiradas uns aos outros. Falando nisso fui na festa da lavagem outro dia porque aqui tem lavagem para tudo, rua, escada, beco, encruzilhada. É só dizer o dia e o local que a lavagem será armada. A lavagem para quem não sabe é uma festa popular com muita música, bebida e dança, podendo ter uma conotação religiosa ou profana. Aos mais íntimos da cultura a lavagem também pode vir acompanhada da enxaguada, que nesse caso também é uma festa, mas que pela ordem dos fatores se o leitor for bom de lavar roupa, ocorre depois da festa da lavagem.
Apesar de tudo as pessoas no fundo têm um coração bom. Alguém pode até te dar um copo de água e um lanche se você aparentar faminto, mas tenha a cautela de verificar se já não está estragado, pois muitas vezes doamos aquilo que não nos serve mais de tão duro que o pão está ou de tão antigo que o feijão ficou na geladeira. A boa vontade existe e é latente, mas resistimos muito a oferecer ao outro aquilo que ainda nos serve. Talvez sejam marcas de uma pobreza antiga ou o pensamento de que amanhã aquele pote de feijão ainda poderá salvar o almoço.  Entretanto, se te oferecerem um copo de cerveja tenha certeza que ele virá gelado, pois na bebida todos se encontram com a garrafa recém-aberta.    
Aqui todo mundo é tio ou tia se o interlocutor for uma criança pequena ou adolescente. A proximidade cruza inúmeras barreiras e em poucos minutos você pode virar o amigo de infância ou a princesa de alguém. Conversas de negócio podem vir acompanhadas de piadas e apelidos numa via informal. Mas apesar de parecermos relaxados aqui o trabalhador sai cedo de casa e sempre se depara com o engarrafamento constante e o ônibus cheio. Ouvi outro dia de um rapaz na rua que a cidade estava estranha pois ele não havia pego um engarrafamento. Se eu pudesse faria a cidade ficar estranha todo dia, mais ainda se fosse capaz de reduzir a música alta e o número de outdoors.
Uma cidade linda mesmo sendo feia. Ainda lembro quando falei essa frase sem sentido. Estava dirigindo dois anos atrás pela cidade baixa com um amigo no carona. Ele de outro estado replicou que aqui não era lá um lugar bonito. Não podia deixar aquilo passar, tinha tanto orgulho da minha cidade que os meus olhos viam beleza até nas casas caídas e no povo sofrido. Como não admirar aquele que tem força e segue em frente mesmo no caos? Como não achar bonita as marcas de sol no rosto de quem aguenta passar o dia inteiro exposto pelas ruas. Muita crueldade não ver a bravura e a beleza que moram nesses atos.  
A minha cidade em seu projeto que não existiu tinha tudo para ser o paraíso, hoje ela tem tudo, shopping da moda, carro importado, roupa bonita, só não tem a minha bucólica paz.



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Música


Atualmente eu prefiro deixar o rádio desligado. A mesma música que eu ouvia quando criança é a que toca no especial do meio dia e quando não é sobre amor é sobre sexo ou sobre sexo sem amor. 

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Como mudei a forma de ver a minha vida

Tenho tantas coisas que gostaria de escrever, mas por falta de tempo e preguiça acabo deixando os pensamentos para trás. Em parte, acredito que deveria praticar mais a minha escrita. Tenho escrito pouco e como toda habilidade vem com a prática, começo a sentir dificuldade em expressar minhas ideias. Os parágrafos saem pela metade e o pensamento inicial se perde em meio a vírgulas e pontos de continuação.

Para dar mais ordem aos fatos que sucederão em breve vou dividir a história em duas. Primeiro porque aconteceram em momentos diferentes e segundo porque o sentido que deram a minha vida foram marcantes.

A primeira história aconteceu quando fui fazer uma trilha que inicialmente deveria levar oito horas. Cinco pessoas, muito entusiasmo, mas pouco preparo físico. Começamos a trilha pela manhã e antes mesmo de chegarmos ao pé da montanha havíamos feito umas três paradas pra descanso. Era longe? Era. Uma hora ou mais só pra chegar no pé da montanha, mas até aí ainda íamos bem. Tínhamos lanche, água, casaco, tudo preparado. Mas antes de começar a descrever o que houve deixa eu dar uma breve ideia de quem ia comigo.
Dos cinco, duas jovens, uma cheia de energia e pronta para bater o recorde de subida mais rápida da montanha e outra com muita boa vontade, mas com um passo que levaria três dias para completar a trilha. Opostos. Mais dois jovens, um sociável e animadíssimo para tirar alguns selfies e outro de cara amarrada, que apesar de ter potencial para ser gentil só utiliza desse dom em momentos especiais da vida. Opostos. E lá ia eu no meio.
Como se pode imaginar o grupo se dividiu em poucos instantes, a jovem iniciou sua corrida contra o tempo e disparou na frente largando o resto do grupo para trás. A outra jovem com seu passo lento ficou no final do grupo sendo amparada pelo jovem sociável. Eu que não queria ir na frente e largar o resto do grupo fiquei no meio assim como o outro jovem carrancudo. Trabalho em equipe nível zero, diálogo em pontos negativos. Aos poucos o jovem que vinha comigo resolveu tirar os fones e começamos a conversar. Apesar de seu constante ar zangado e piadas sarcásticas ele aparentou ter um bom espírito. 
Finalmente, chegamos no pé da montanha, uma paisagem linda com as montanhas enormes cheias de neve no topo, um rio correndo no meio com um espaço para formar pequenos lagos de vez em quando. Mas só chegamos no pé da montanha depois de horas! Queria rir pela brincadeira que aquilo parecia. A montanha que deveríamos escalar era um bloco grande formado de pedras de diversos tamanhos empilhadas umas sobre as outras e soltas. E mais, estava nevando no topo da montanha, frio, já um pouco nublado e a recomendação era se começássemos a subir não poderíamos voltar pelo mesmo caminho devido ao risco das pedras rolarem e torcermos alguma coisa. Se começar precisa terminar, sem volta, vai até o fim, ponto final.
Era isso. Começamos. Pensando bem, com o grupo não uniforme que formávamos não seria muito recomendado iniciar essa aventura, mas lá fomos nós. Tive medo de altura, medo de cair rolando, medo de não pisar rápido o suficiente entre as pedras e alguma se soltar antes de eu dar o meu próximo passo, mas acima do medo a coragem. E que coragem? No meio do caminho senti um frio na espinha, estava exausta, minhas pernas mal me sustentavam. Estava no meio do início e já me faltava energia para continuar. Sentei e admirei a paisagem de tão alto pelo menos para fazer valer a pena todo aquele esforço. Era assustador ver aquela imensidão. Assustador ver quão lindo o mundo pode ser. Morri de medo em me ver no meio da montanha de pedras, acima do vale e entre tantos gigantes naturais como se eu estivesse dentro de uma foto ou de um livro. Olhei para cima e vi que o jovem carrancudo também estava sentado e me esperando. Aos poucos criei coragem para subir e consegui sentar próxima a ele.
Ele quase que deitava sobre uma rocha grande equilibrada entre outras rochas menores. Lá mais em cima eu via a jovem quebradora de recordes e lá embaixo os outros dois subindo entre selfies e paradas para descanso. No meio do caminho íamos nós. Conversamos qualquer coisa e comentei como aquilo parecia difícil de completar. Uma trilha que ainda na primeira parte já esgotava minha energia de tanta força que eu colocava para galgar as pedras. Uma a uma eu me segurava, testava a próxima e subia passo a passo. Apesar de não ter esperado ele me respondeu algo que mudou a forma como vejo a vida, não lembro em nada as palavras, mas ficou a sensação que elas me deixaram. E é por isso que contei todo esse enredo até agora, para narrar a vocês o  que mudou a minha forma de ver a vida...
Num caminho sem volta assim como a vida cada passo é incerto, cada pequeno movimento pode te levar a uma ascensão ou a retroceder dois passos se a próxima pedra não estiver firme na sua posição. Não sabemos quando esse caminho vai acabar e muitas vezes cansamos exaustivamente ainda no início, mas não podemos desistir, pequenos passos serão grandes avanços.
Naquele dia eu ouvi que estava sozinha, não importasse o quanto ele me esperasse para fazermos a trilha juntos, as pernas que me fariam subir a montanha eram as minhas, a força para ir até o fim viria do meu corpo, e no fim eu estava só desafiando a mim mesma num caminho sem volta. Você pode até caminhar com amigos, mas a sua caminhada quem trilhará será você.
Eu estava com medo pela altura, pela falta de trabalho em grupo e pelas pedras que me faziam subir em diferentes velocidades. Às vezes bem devagar tentando achar onde por a mão ou o pé no próximo passo, outras vezes bem rápido para não dar tempo de escorregar. Mas apesar de tudo eu tinha que seguir em frente, tomar conta de mim mesma contra o frio e a fome, descansar quando preciso, caminhar sempre.
Fiquei com vontade de chorar. Queria ouvir que poderia contar com alguém, que se algo ocorresse teria apoio, mas ouvir que estava só fazia as coisas mudarem de cor e eu vi aquela trilha passar a ser a minha vida. E ele estava certo, por mais que alguém me ajude a minha vida é trilhada por mim e ninguém mais.

Caminhamos juntos, passamos por gelo e neve. Um doce e breve olhar sobre os vales em torno da montanha, inúmeros lagos e rios, cachoeiras brotando entre as pedras de montanhas distantes. Tudo visto em um relance, entre piscar de olhos e passos triunfantes de quem chegou ao topo sem saber que ainda restavam mais quatro horas pra descer a montanha. Terminamos todos juntos devido à escuridão que nos alcançou depois do pôr-do-sol, entre lanternas e celulares saímos vivos com o nosso grito de guerra “hambúrguer, suco, batata, arroz, bife, jantar”, todas as palavras que poderiam fazer mover cinco esfomeados. Trabalho em grupo apesar de tudo.  


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 A segunda história fica pra outro dia... já é tarde e o travesseiro me chama.


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Pensamentos aleatórios

Muitas coisas têm acontecido e aos poucos eu vou tentando colocar alguma ordem na bagunça da minha vida. A volta aos engarrafamentos, ao calor, ao medo de ser assaltada, as orações para ter paciência e o pão nosso de cada dia. Mudanças que apesar de eu tentar não me sentir incomodada às vezes me esmagam contra à parede. Como nem tudo na vida é ruim, isso também vem acompanhado do carinho da família, da atenção dos amigos e de uma forma um pouco mais madura de entender o que ocorre comigo.
Um dos pontos mais importantes que notei em mim mesma é que sou extremamente sociável e eu preciso sair e ver as pessoas que me são queridas para me sentir bem. Já tinha ouvido isso anteriormente, mas agora pude perceber na própria pele como o meu humor e o meu dia podem mudar completamente quando interajo socialmente, me expresso, escuto as pessoas e saio para viver mesmo que poucas horas do dia ao ar livre. Eu já sabia que passarinho engaiolado não canta de alegria, mas agora isso faz completo sentido para mim.
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O poder da intuição

Intuição é uma sugestão sutil em nossa mente que geralmente indica uma direção a ser tomada.
A intuição é muitas vezes negligenciada por ir na direção oposta aos nossos desejos e planos. Com frequência ela nos chega para apontar uma maneira mais segura de efetuar uma operação ou mesmo para dizer que devemos parar em casa por alguns minutos antes de irmos ao trabalho. Não podemos culpar as pessoas por não ouvirem a sua intuição, pois muitas vezes é difícil reconhece-la. 

sábado, 9 de janeiro de 2016

Feliz ano novo, feliz ano velho

Toda transição é difícil. Ainda lembro dos meus últimos meses antes de viajar, parecia como se eu estivesse trancada dentro de um liquidificador de emoções. Mas lá fui eu com duas malas, uma mochila e um urso de pelúcia. Os primeiros dias foram difíceis... ou melhor, os primeiros dois meses pode-se dizer. Até que de repente eu me vi completamente adaptada à cidade, conhecendo pessoas e sobrevivendo ao clima.

Depois de mais um tempo eu já não ligava tanto para o frio e comecei a viver uma das mais fabulosas experiências que já tive. Muita gente me pergunta a razão de eu gostar tanto daquela cidadezinha longe de "tudo", com um clima instável... O que me vêm em mente agora foi o dia em que eu estava numa aula sobre "Small talks" e comentando sobre a neblina densa que não nos deixava ver nem um palmo através da janela eu disse "o lugar é tão mágico que é como se o céu descesse e estivéssemos dentro das nuvens". Tudo depende do seu ponto de vista.

Cheguei a um ponto em que eu conhecia tantas pessoas que passei a recusar saídas frequentemente só para ficar em casa e poder estudar um pouco. Mas sabe outra coisa que eu adorava? Festas em casa, jantar entre amigos, ou então convidar alguém para passar em casa e ficar conversando. Eu já tinha ouvido falar que em Salvador a gente praticamente nunca vai na casa do outro, sempre se encontra pela rua, e eu descobri que é verdade. Mas é tão gostoso receber ou ser recebido em casa...

 Sempre morei em uma casa quase que sozinha já que vejo minha mãe apenas entre os curtos intervalos da manhã e da noite. Pela primeira vez morei em uma casa com mais de sete pessoas hahaha, às vezes mais, pouquíssimas vezes menos. Encontrar alguém ao acordar, ter companhia na hora de cozinhar ou no café da manhã, ter alguém esperando para comer o jantar juntos, brigar por causa da sujeira, dividir a comida, conversar no corredor. Nada disso tem preço, ainda mais quando se é acostumada a viver sozinha.

Mesmo com todos os dias nublados de uma nuvem densa e baixa que pairava sobre a cidade eu estava bem. E a alegria de poder fazer uma trilha a qualquer momento do dia? Passei horas andando em torno de lagos e na margem dos rios, que faziam pequenas cachoeiras só pra depois virarem calmos rios de novo. Me doi tanto andar por Salvador e não ter aonde andar. Não ver tantas árvores pelo caminho me machuca... Eu andava todos os dias, muitas vezes tão longas distâncias que deixava quem me conhecia surpreso. Qualquer hora, qualquer direção, de tristeza ou felicidade lá ía eu andando. Que gostoso que era sentar pertinho da árvore por onde um estreito corrego passava. Vinha desde lá de cima da montanha e fazia um barulhinho bom quando chegava lá em baixo, já perto do lago. Como era bom sentar naquela banco cheio de pássaros que vinham se alimentar dos grãos que as pessoas colocavam dentro de uma armação de metal. Vinha o pássaro grande azul, o pequeno marronzinho, o pássaro preto, todos eles sem se importar muito com a minha presença parada observando.

Eu recebia até uma quantia de dinheiro suficiente para ter uma vida extremamente confortável, mas ao contrário do esperado eu não comprava roupas, não tinha luxo, nunca tive, mas fui ao extremo e quanto mais simples eu era mais feliz eu ficava. Ninguém ou quase ninguém comentava como eu me vestia ou se eu estava morena demais ou pálida demais, ninguém perguntava porque eu não uso maquiagem, porque eu não uso perfume, sem porquês. Mas diariamente eu recebia elogios. Engraçado isso...

Eu era mais educada e isso tem me surpreendido diariamente desde que voltei. Eu não consigo ser aqui tão educada quanto eu era lá. Pedir desculpas ou por favor era tão natural quanto respirar. Ser gentil nas palavras, observar as pessoas, tudo vinha como se fossem as coisas mais banais do mundo. Eu nunca confiei muito quando andava na rua, sempre alerta a quem vinha na minha direção, mas eu não tinha tanto medo. Aqui, mesmo sem querer eu saio na rua com um espírito de violência enorme, preparada para atirar uma pedra na primeira pessoa suspeita. Mas que loucura é essa?
Não consigo ser tão gentil mesmo fazendo esforço, tá no jeito de falar, de andar, de olhar para as pessoas, no gosto amargo do medo.

Fico pensando quando vou me adaptar ou até mesmo se vou me adaptar.
Já estou bem com a temperatura e o clima. Mas e o resto? Não sei... talvez, como diz a música "Eu não vou me adaptar, não vou me adaptar..."