segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Aventuras pitorescas - Parte dois: Saudades sempre

O último dia de coração plenamente aberto para o mundo ocorreu em agosto, era dia de semana e eu estava em pé próxima a um orelhão. Na época já não se colocavam mais fichas no telefone e era necessário ter o cartão para se fazer uma ligação, mas eu não tinha, muito menos tinha seu telefone. Havia um festa para as crianças e uma apresentação a ser feita. Alguém me disse que você chegaria e eu acreditei. Em pé na grade esperei e nada mais. Esperei mesmo sabendo que não chegaria, mas depositei minha fé na hipótese de estar errada.

Fui embora e você não chegou.

Foi o último dia de tristeza, pois depois daí enterrei as emoções e encontrei uma forma nova de viver. Popularmente conhecida como sangue de barata desenvolvi a técnica de repudiar as emoções durante alguns anos. Ainda hoje trabalho com ela em determinadas situações, mas em geral me libertei e vivo à base de confiança na energia do universo e rio de sensações.

Nunca fui ligada ao estudo do esoterismo o que me encantava era apenas a engrenagem das coisas, mas quem diria que através da cara sempre vive a coroa...

Continuei pedindo sabedoria e aos poucos evolui para o anseio de me tornar água que corre para o mar, pedra dentro do rio, matéria-prima do artesão, luz de vela que não apaga.
Desejei a voluptuosidade da água, sua tranquilidade e força para atravessar barreiras contornando, transformando e purificando ao meu redor. Quis estar no rio como pedra para ser lapidada e de bruto jargão me ver pedra preciosa, arredondada, moldada pela vida em uma pessoa melhor, como matéria-prima para as obras de Deus, incandescente para iluminar os que andam ao meu redor.

Quis ser cristal, pureza e amor.

A solidão se esvaiu aos poucos à medida que a água se sobrepunha. Lavada em lágrimas e alfazema a alegria reinou, pois só se vive em reino de alegria aquele que conheceu o profundo breu da existência em algum momento de sua vida.

Com o meu sorriso de quatorze anos vi o mundo me retribuir sorrindo intensamente ao meu redor e em três anos vivi o êxtase de se ter uma criança interior desperta e energeticamente liberta. Acordava durante a madrugada para sorrir de uma piada contada pela manhã, despertava feliz sem motivo aparente.
Viver se tornou leve.

Alimentar a ânsia pelo desconhecido era sua meta. Viver em risos e pulos era o seu passatempo.

Muitas pessoas passaram pela minha vida, algumas acrescentaram outras apenas passaram observando, mas lá estavam as possibilidades de vida, a escolha certo ou tarde deveria ser feita.

E então, na vida são feitas escolhas ou somos escolhidos?



O caminho é feito a partir do primeiro momento em que você pensou nele.
Mentalizar pensamentos positivos e nada mais. 
Nada mais.



Aventuras pitorescas - Primeira parte: Descobrindo a existência

Não sei mais dizer quando foi que me dei conta de mim, quando descobri que sou pessoa e deixei de viver no mundo abstrato das crianças extremamente pequenas. Não sei mais quando descobri que eu sou eu.

Vagas lembranças assolam a minha mente como se de repente um recorte de várias fases fosse sendo apresentado numa tentativa de somar as peças.
Era noite e eu passava mal, saí do quarto em direção ao banheiro e com as minhas pernas de seis anos de idade caminhei às pressas como um adulto durante o porre da cachaça faria. Abri a porta e vomitei, vomitei a doença e as emoções há muito repreendidas. Vomitei a tristeza da solidão e a dor. Vomitei o jantar das sete e as lágrimas da semana. Vomitei a perda e insegurança.
Tomei banho, me vesti e voltei para o quarto. Dormi o sono dos anjos porque a minha linhagem descende dos anjos de coração.
No dia seguinte a descoberta pelas pessoas da casa de que eu havia passado mal pela sujeira do banheiro não me abalaram, já não havia mais motivos para me abalar.

Era noite, mas não mais àquela de outrora, e ver a tristeza em seus olhos brilhantes me enchia de compaixão. Com minhas mãos de sete anos rezei pedindo a Deus o esquecimento das dores vividas. Apoiei a cabeça em seu colo e fingi que dormi apenas para que me deixasse no quarto e acabasse rápido com o vazio.

Viver entre os extremos sempre foi minha sina. Explosão de alegria também se transforma em rio de lágrimas, mas só assim se descobre o caminho a se trilhar.

Engraçado, mas novamente era noite e sentada na escada que ligava a rua ao primeiro andar eu lia uma enciclopédia usando a luz do poste para me guiar entre as palavras. Com os olhos de oito anos descobri o lado científico da anatomia e da sexualidade. Me descobri num corpo de menina.
Nesse mesmo período comecei a escrever poemas, infelizmente acredito que perdi todos, mas sei que eram lindos. Provinham da inspiração que só os loucos possuem. Simplesmente sentava na cadeira da vandara e me debruçava na mesa de plástico com meu mundo de ideais a ser transcrito.

A curiosidade assolava a minha existência e foi então que aconteceu.

Entre os degraus do primeiro para o segundo andar, já havia passado das nove horas da noite quando pedi a Deus por inspiração e sabedoria. Em meus anos de criança decidi que pediria a Deus o dom da sabedoria.
Sentada na escada falava a língua do desconhecido e conversava comigo mesma em uma espera incansável pelo conhecimento.

O esquecimento dos dias tristes chegou e eu apenas guardei a ânsia de vômito em situações que despertam amor incondicional. É preciso perdoar o outro e a si próprio para se libertar das amarguras da existência. O perdão da alma nos eleva.

A vontade de descobrir o universo sempre foi uma constante, oscila, mas sorrateira acompanha os infinitos sonhos. E foi a partir do universo, da ânsia por saber de sua mecânica e quântica que a teoria das ondas energéticas surgiu.
Com a mente de nove anos decide memorizar para o resto da vida três teorias que devem guiar o meu caminho:
A primeira se relaciona com o bem querer ao próximo, ajudar aquele que precisa e através da compaixão ampará-lo.
A segunda é sempre continuar com o espírito de criança. Sofrer o que for preciso para não deixar a curiosidade e intuição viva da criança interna ser rarefeita. Assim como saber ouvir as crianças e não me deixar convencer pelos adultos de que os pequenos não sabem ou não entendem do mundo.
A terceira e última é a teoria do universo. Ao meu ver o universo é uma onda energética que oscila em diferentes vibrações, com suas frequências e amplitudes específicas. Cada um de nós vive em uma frequência e oscila a depender do estado de espírito em que se encontra. Viaja entre as frequências e pode ir do extremo da iluminação ao extremo da negatividade. Ao morrer a energia etérea se une à vibração maior e entre em completude com a sua frequência interior construído durante seus dias de vida.
Ser humano é se permitir ter a capacidade alterar sua frequência. Enquanto somos energia a amplitude e frequência da vibração é constante, mas quando somos humanos conseguimos em questão de instantes emergir em uma nova sintonia.





Eis o mistério da vida.
Eis a simplicidade da fé.
Na compreensão o caos se tornou ordem.


sábado, 2 de novembro de 2013

Diário de bordo

Considerações iniciais
Já faz um tempo que venho me preparando para os dias atuais, mas ainda assim a cada amanhecer eu me arrumo e repasso os preparativos. Durante o dia às vezes paro e sento sozinha para relembrá-los, e só no final me sinto livre e com a sensação de missão cumprida.
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Terceiro dia de viagem, já é noite e eu posso dizer com propriedade que em 72 horas eu vi mais do que muita gente conseguiu ver em um mês. Provavelmente esse é um dos pontos positivos de se estar só, pode-se caminhar a vontade e na velocidade que achar necessário, se perder é uma alegria e abertura de caminhos para novas descobertas.
Conheci pessoas simples e interessantes, espiritualmente ativas, e superficialmente consegui observar algumas peculiaridades ao meu redor.

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Da primeira vez que vi a cidade me arrependi em pensamento por não portar um guarda-chuva, pois ao longe eu já conseguia ver uma nuvem negra cobrindo grande parte do céu. Para minha surpresa era somente poluição, densa sujeira aérea invadindo nossas narinas. Mais assustador que muito filme.
Consegui intuitivamente e depois de muito explorar a funcionária do posto de informações descobrir o melhor trajeto para realizar em um dia de visita.
Corri disfarçando o meu desconhecimento e me deixei levar pela coragem e multidão sabendo que no final encontraria o tão almejado metrô.
Subi, desci, olhei e me assustei novamente.
A cidade parecia estar sendo estuprada pelos visitantes, uma leva enorme de turistas em busca de facilidades, oportunidades e preço baixo invadiam as ruas e os meios de transporte da cidade. Todos em busca de produtos tão baratos que ao meu ver só podem alimentar o trabalho de semi-escravidão que nos submetemos hoje. Mas quem quer saber?
Desci, subi, desci e me compadeci.
A luz do Sol se embrenhava entre a poluição, mas aparecia gloriosa através do céu, seu calor irradiava ao meu redor, mas as pessoas continuavam sentindo frio. Casacos e roupas e botas e cachecol e frio e frio e frio no calor. Por instantes pensei em parar alguém para perguntar se era uma lei sentir frio na cidade, mas não fiz isso, seria ridículo demais. Conclui que as pessoas padecem de frio interior, já que estão imersas em tamanho cansaço, tristeza e solidão. Submergiram a ponto de se afogar e previamente já se vestem de preto em luto pelo eu interior perdido. Luto ao esquecimento de si.
Andam em luto pela falta de amor ou em sua incansável busca... ou quem sabe a espera de um renascimento.
Subi, desci e me perdi.
Me perdi no estilo da cidade, entre gótico, neoclássico e um quase raro rococó, me apaixonei e ao mesmo tempo repudiei a imagem da cidade. Lindamente gótica, e em seu esplendor a vivacidade da tristeza. Mas que contradição! Quanto mais bela mais triste se faz.
Lindamente enlouquecedora.
Desci, subi e me encontrei.
Em um centro de arte sacra e um bairro oriental encontrei as cores e uma tranquilidade constante. Seria o oásis? Não sei... e continuarei sem saber.

Subi e voltei ao meu mudo de aventuras pitorescas.

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Engraçado, mas só agora entendi uma exposição que vi no museu. Era o retrato da cidade... em sua inconstância, desespero e anseia pelo que ainda não viveu, o autor me mostrou sem eu nem desconfiar aquilo que aguarda aos que mergulham e não voltam mais à superfície das boas energias.


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Para viver feliz é preciso ser e estar.