quarta-feira, 24 de agosto de 2016

Véu dos meus olhos




É fácil ser bom entre os bons.

É fácil ser gentil entre os gentis.

Honra o seu caráter quando for bom entre os lazarentos de coração.

Se alegra do seu progresso quando for gentil com os arrogantes.

Porque qualquer um pode ser bom entre os bons, mas só os verdadeiros conseguem passar pela prova.


Lembra: É fácil ser bom entre os bons.


Like the wind

Naquele dia eu cheguei super cedo, acho que com uma hora de antecedência, pensei em estacionar o carro e caminhar próximo à praia, mas aquele sol de meio dia me fez mudar de ideia. Andei até a praça ali perto e sentei em um dos bancos. Do outro lado, no meio da praça estavam uma senhora, uma jovem, um senhor e um menino  nuelinho de aparentemente dois anos de idade.
Qualquer um veria que eram moradores de rua e que estavam ali almoçando. O menino era filho da moça de short jeans e blusa de alça. Danado que era não parava em um canto, moreno, com as perninhas definidas como todo criança tem, tinha no lado direito do rosto um arranhão vermelho vivo que devia ter sido de alguma queda recente.
Flavinhooo! Flavinho, desce daí. Sua mãe chamava enquanto ele ria e corria ao redor da praça brincando sozinho. Corria atrás do pombo, caia, levantava, subia nos bancos e chamava atenção de todos que passavam pela beleza da sua nudez de criança, nudez de corpo e de alma.
Não lembro quem sorriu primeiro, só sei que ele veio brincar perto do banco em que eu estava sentada. Subia no banco, pulava no chão, sentava do meu lado e olhava atento pra o papel que eu segurava como se também quisesse saber que negócio interessante (ou não) era aquele que me prendia a atenção. De repente Flavinho pegou uma folha do chão e falou "Óo!" e eu respondi "Hmm, a folha é da árvore" com aquele tom de quem acabou de falar algo super importante. Mas ele continuava "Ó, ó!", parou embaixo da árvore, olhou para cima e suspendeu a mão que segurava a folha como se quisesse de alguma forma prender novamente aquela folha amarelada na árvore.
Nesse instante eu sabia que havia algo ali para eu aprender, e que aquela criança me mostrava alguma coisa que até então eu não tinha entendido. Flavinho veio até mim e me deu a folha, na verdade ele jogou a folha na minha direção. Eu peguei do chão e segurei para entregá-lo, mas ele olhou para mim, apontou para o topo da árvore e fez "Ó". Eu já tinha entendido que ele queria prender a folha na árvore novamente. Tentei falar alguma coisa sobre não ser possível, mas que não me recordo bem agora. Depois disso ele brincou, caiu, jogou folha e pedra para cima e eu tive que ir embora devido ao horário.

Mas o que aquele menino nuelo queria me mostrar?

Dentre as várias interpretações daquele dia eu entendi que tudo passa, tudo tem seu tempo e que por mais que façamos um esforço para retornar ao que já se viveu não há como fazer isso acontecer. Assim como a folha que cai da árvore não pode ser presa novamente ao galho, nós não podemos nos prender a locais, pessoas ou momentos que passaram pela nossa vida.
A árvore era uma amendoeira daquelas que tem a folha grande e vistosa. O topo da árvore estava cheio de folhas de cores variadas, várias verdes, muitas alaranjadas, outras quase vermelhas. Apesar de ser final de inverno aquela árvore parecia ainda estar no outono. Cada folha em um momento diferente de desenvolvimento compartilhando da vida em comum presas aos galhos da árvore. Mas aquela na mão de Flavinho já havia caído, seu tempo no galho tinha terminado e ela agora voava errante com o vento.
De certa forma nossa vida também é assim. Podemos ser como uma folha na vida de alguém. Brotamos, participamos da vida daquela pessoa e depois com o tempo viramos a folha caída que não encontra mais espaço entre os galhos. Ou mesmo quem sabe a árvore ali mostrasse a energia que nos move e cada folha nosso momento de desenvolvimento e crescimento na vida.

Mas não se devolve ao galho uma folha caída... ou devolve?
Não sei... Só sei que tudo passa... tudo passará.
Cabe a nós viver o hoje.