Depois de mais um tempo eu já não ligava tanto para o frio e comecei a viver uma das mais fabulosas experiências que já tive. Muita gente me pergunta a razão de eu gostar tanto daquela cidadezinha longe de "tudo", com um clima instável... O que me vêm em mente agora foi o dia em que eu estava numa aula sobre "Small talks" e comentando sobre a neblina densa que não nos deixava ver nem um palmo através da janela eu disse "o lugar é tão mágico que é como se o céu descesse e estivéssemos dentro das nuvens". Tudo depende do seu ponto de vista.
Cheguei a um ponto em que eu conhecia tantas pessoas que passei a recusar saídas frequentemente só para ficar em casa e poder estudar um pouco. Mas sabe outra coisa que eu adorava? Festas em casa, jantar entre amigos, ou então convidar alguém para passar em casa e ficar conversando. Eu já tinha ouvido falar que em Salvador a gente praticamente nunca vai na casa do outro, sempre se encontra pela rua, e eu descobri que é verdade. Mas é tão gostoso receber ou ser recebido em casa...
Sempre morei em uma casa quase que sozinha já que vejo minha mãe apenas entre os curtos intervalos da manhã e da noite. Pela primeira vez morei em uma casa com mais de sete pessoas hahaha, às vezes mais, pouquíssimas vezes menos. Encontrar alguém ao acordar, ter companhia na hora de cozinhar ou no café da manhã, ter alguém esperando para comer o jantar juntos, brigar por causa da sujeira, dividir a comida, conversar no corredor. Nada disso tem preço, ainda mais quando se é acostumada a viver sozinha.
Mesmo com todos os dias nublados de uma nuvem densa e baixa que pairava sobre a cidade eu estava bem. E a alegria de poder fazer uma trilha a qualquer momento do dia? Passei horas andando em torno de lagos e na margem dos rios, que faziam pequenas cachoeiras só pra depois virarem calmos rios de novo. Me doi tanto andar por Salvador e não ter aonde andar. Não ver tantas árvores pelo caminho me machuca... Eu andava todos os dias, muitas vezes tão longas distâncias que deixava quem me conhecia surpreso. Qualquer hora, qualquer direção, de tristeza ou felicidade lá ía eu andando. Que gostoso que era sentar pertinho da árvore por onde um estreito corrego passava. Vinha desde lá de cima da montanha e fazia um barulhinho bom quando chegava lá em baixo, já perto do lago. Como era bom sentar naquela banco cheio de pássaros que vinham se alimentar dos grãos que as pessoas colocavam dentro de uma armação de metal. Vinha o pássaro grande azul, o pequeno marronzinho, o pássaro preto, todos eles sem se importar muito com a minha presença parada observando.
Eu recebia até uma quantia de dinheiro suficiente para ter uma vida extremamente confortável, mas ao contrário do esperado eu não comprava roupas, não tinha luxo, nunca tive, mas fui ao extremo e quanto mais simples eu era mais feliz eu ficava. Ninguém ou quase ninguém comentava como eu me vestia ou se eu estava morena demais ou pálida demais, ninguém perguntava porque eu não uso maquiagem, porque eu não uso perfume, sem porquês. Mas diariamente eu recebia elogios. Engraçado isso...
Eu era mais educada e isso tem me surpreendido diariamente desde que voltei. Eu não consigo ser aqui tão educada quanto eu era lá. Pedir desculpas ou por favor era tão natural quanto respirar. Ser gentil nas palavras, observar as pessoas, tudo vinha como se fossem as coisas mais banais do mundo. Eu nunca confiei muito quando andava na rua, sempre alerta a quem vinha na minha direção, mas eu não tinha tanto medo. Aqui, mesmo sem querer eu saio na rua com um espírito de violência enorme, preparada para atirar uma pedra na primeira pessoa suspeita. Mas que loucura é essa?
Não consigo ser tão gentil mesmo fazendo esforço, tá no jeito de falar, de andar, de olhar para as pessoas, no gosto amargo do medo.
Fico pensando quando vou me adaptar ou até mesmo se vou me adaptar.
Já estou bem com a temperatura e o clima. Mas e o resto? Não sei... talvez, como diz a música "Eu não vou me adaptar, não vou me adaptar..."
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